PENA & LÁPIS


Folhetim:

O Chantagista

– Capítulo VII

Por Jorge Moreira Leonardo

Sol Português

– "Falta-me acrescentar que fui o mandante do crime, pois aquele canalha não merecia outra coisa. Ia passar o resto da vida martirizando o meu patrão e creio que até outras pessoas. Quanto ao executante. nunca vou divulgar e rezo para que nunca o descubram."

Voltaram atrás e informaram o empresário que estava dispensado de comparecer na PJ e explicaram-lhe porquê.

O inspector leu os direitos ao empregado, mas quando ia algemá-lo o patrão implorou:

– "Pelo menos na minha presença não o façam."

Abraçou-se a ele, chorando, e garantiu-lhe que ia contratar o melhor dos advogados.

Levado para as instalações da PJ, foi introduzido numa sala de interrogatórios onde fez um depoimento completo de toda a situação, o qual, depois de lido, assinou.

Instado novamente para indicar o autor material do crime, recusou. Considera-se o único criminoso que só não executou por falta de coragem. E além disso, foi ele o condutor do carro. Bem gostaria de o ter feito com as próprias mãos.

Acrescentou ainda que não considera o autor material do crime como alguém perigoso para a sociedade. Muito mais perigoso seria aquele monstro. Quantas pessoas e mesmo famílias iria ele desestabilizar? Pediu também que informassem o patrão só do que fosse indispensável e entregou o telemóvel que retiraram da vítima.

Presente ao procurador do Ministério Público, repetiu o que relatara no depoimento e manteve a intenção de assumir inteira responsabilidade pelo assassinato. Porque – acentuou – aceitando que ninguém deva exercer justiça pelas próprias mãos, entende que embora tenha de arrostar com as consequências do seu acto, não cometeu um assassinato, mas sim a execução de um escroque sem quaisquer escrúpulos.

O delegado recordou-lhe que a denúncia iria talvez reduzir-lhe a pena e a ocultação, considerada obstrução à Justiça, agravá-la. Limitou-se a um encolher de ombros.

Levado à presença do juiz, este perante os factos entendeu, devido à ausência de antecedentes criminais, estarem reunidas as condições para que o arguido aguardasse o julgamento em liberdade, apenas não se podendo ausentar da ilha.

O julgamento aconteceu 30 dias depois e o procurador da República pediu uma pena de apenas seis anos, considerando que a vítima estava possuída de inequívocas intenções de perturbar um número considerável de pessoas e famílias com o fim de extorquir dinheiro e, ao contrário do réu, era um cadastrado. Só não podia uma pena mais leve pela sua obstinação em não divulgar o autor material do crime.

O advogado de defesa quase secundou a argumentação do procurador, só reconhecendo a legitimidade do réu querer assumir a total responsabilidade, pelo que isso não devia constituir obstáculo a uma benignidade na atribuição da pena. Até porque, segundo o réu, o autor material do crime não constitui perigo para a Sociedade.

A sentença, lida 15 dias depois, foi de cinco anos de prisão e o Colectivo de Juízes recomendou que todo o material utilizado na instrução do processo fosse destruído na presença do procurador. (Fim)


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