COMUNIDADES EM FOCO


Procissões do Enterro do Senhor percorrem várias ruas de Toronto

Igrejas de São Francisco de Assis e de Santa Helena evidenciam religiosidade das comunidades que servem

Por Rómulo Ávila

Sol Português

Aquela que é considerada a mais solene e comovente de todas as procissões que se realizam no âmbito das celebrações da Semana Santa, a Procissão do Senhor Morto, voltou a sair às ruas de Toronto, demonstrando que a pandemia pode ter colocado um ponto final em muitas realizações, mas que em questões de fé e religiosidade, as tradições portuguesas mantém-se intactas.

Na tarde de Sexta-feira Santa, 7 de Abril, precisamente às 15h00 – hora em que, rezam os textos bíblicos, se deu a "paixão e o adeus de Cristo à vida terrena" – a procissão organizada pela igreja São Francisco de Assis saiu à rua, percorrendo algumas artérias adjacentes àquele templo religioso situado no coração de Toronto.

Ao longo do percurso foram-se juntando os populares que, acompanhando as várias congregações católicas e as representações das comunidades religiosas pertencentes àquela paróquia, incluindo muitos portugueses, tomaram parte nesta Procissão do Enterro do Senhor.

As bandas filarmónicas, como sempre, deram um colorido e um som especial ao cortejo, que teve início após a cerimónia da Celebração da Paixão de Cristo que se realizou no interior daquela igreja católica romana, fundada em 1902 e localizada no extremo ocidental de Little Italy e Trinity-Bellwoods.

Com destaque para a Cruz de Cristo, levada em ombros por um figurante no papel de Jesus, e para a sinalização e representação de várias passagens bíblicas, integravam a procissão vários elementos do clero, bem como entidades oficiais, representantes de várias instituições e demais autoridades civis e militares.

O cortejo terminou com o regresso à igreja de São Francisco de Assis – conhecida na comunidade como a "igreja italiana" – onde as imagens foram recolhidas e, ao mesmo tempo, saudadas pelas filarmónicas presentes.

No final da tarde de Sexta-feira Santa também saiu à rua o cortejo processional da igreja de Santa Helena, situada na Dundas Street West e onde a partir das 19h00 centenas de fiéis acompanharam a Procissão do Enterro do Senhor organizada por aquela paróquia.

Por estar situado em Little Portugal, o templo é conhecido como "a igreja portuguesa" e o cortejo foi acompanhado pela sua filarmónica, a Banda do Sagrado Coração de Jesus, fundada em 1974.

Mais solene do que a procissão anterior, esta é uma manifestação religiosa envolta num manto de quase silêncio, que recorda a morte e a deposição de Jesus.

Foi com esse sentimento que os populares deram corpo e alma à procissão, que foi acompanhada pelos acordes da banda, necessariamente ritmados de forma lenta e fúnebre.

Terminado o cortejo, que percorreu as artérias circunvizinhas, escutou-se, já no interior da igreja, o conhecido sermão que nos dá conta das últimas palavras de Cristo: "Pai, perdoa-lhes, porque eles não sabem o que fazem"; "Em verdade te digo, hoje estarás comigo no paraíso"; "Eis o teu filho; eis a tua mãe"; "Meu Deus, meu Deus, porque me abandonastes"?; "Tenho sede"; "Tudo está consumado"; e "Pai, nas tuas mãos entrego o meu Espírito"!

Notava-se a atenção de todos os que, emocionados, reflectiam no que disse Jesus antes de morrer – palavras profundas que nos ensinam o valor do perdão, da fé e do amor.

No final das cerimónias e em declarações ao jornal Sol Português, o padre Willyans Prado Rapozo fez questão de recordar a importância da Sexta-feira Santa para a comunidade crente.

"Celebramos a Paixão e a Morte de nosso Senhor Jesus Cristo, que demonstrou o seu amor infinito por nós entregando a sua vida na cruz. É o único dia do ano em que não se celebra missa em nenhum lugar do mundo, mas reunimo-nos para a Solene Acção Litúrgica às três horas da tarde, hora em que Cristo deu o seu último suspiro e entregou o seu espírito ao Pai", explicou o pároco.

"Para marcar esse dia de silêncio e penitência, os católicos são convidados ao silêncio, à oração, ao jejum e à abstinência de carne. Queremos experimentar na pele a solidão do Cristo que morreu para libertar a humanidade da escravidão do pecado e do mal. Por esses gestos penitenciais, pedimos ao Senhor força para vencermos os nossos desejos desordenados, e a graça de sermos santos", continuou.

"Rezamos por todos: por aqueles que crêem e por aqueles que não crêem. Todos encontramos refúgio no Coração aberto de Jesus", afirmou o sacerdote, que fez questão ainda de nos descrever o cortejo que ali se havia realizado e a motivação para esta realização anual.

"Levamos a imagem do Cristo morto pelas ruas do nosso bairro; muitos paroquianos vestem-se de apóstolos e das mulheres piedosas; as crianças participam como anjinhos trazendo símbolos da Paixão; fiéis trazem estandartes e tocam as ruidosas matracas; a Banda Sagrado Coração de Jesus toca hinos em louvor ao Senhor Crucificado; o padre acompanhado dos acólitos caminha em silêncio, contemplando este profundo mistério de amor".

"Para nós, da paróquia, este é um momento de muita emoção. É uma forma de expressarmos o nosso amor por Jesus e de darmos testemunho público da nossa fé. Um gesto pequeno em comparação a tudo o que o Senhor fez por nós", destacou.

Embora estas cerimónias atraiam um grande número de fiéis, o padre Rapozo fez questão de lembrar que "o mistério Pascal do Senhor não se encerra na Sexta-feira da Paixão. Termina sim, e permanece para sempre, no Domingo de Páscoa, quando proclamamos que Ele está vivo e é vencedor".

É essa a mensagem da Páscoa, refere, lembrando que "o Cristo Vivo está presente no meio de nós (...) sofreu, morreu, mas ressuscitou, e quer dar vida nova a todos os que entregam a Ele o seu coração. Quer transformar o ódio em amor, a violência em paz, a morte em vida, a tristeza em alegria, as trevas em luz, portanto" – conclui – "alegremo-nos e exaltemos, porque o Senhor ressuscitou verdadeiramente. Aleluia!"

Em ambas as procissões a que assistimos nessa tarde, mais do que as palavras, falaram as imagens, os gestos, as orações e a emoção dos fiéis que, carregados de esperança, acreditam num Deus maior que evidenciou o seu amor por todos, dando-nos uma lição de vida que, mais de 2.000 anos depois, continuamos a reproduzir e a lembrar.


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