PENA & LÁPIS


Folhetim:

O Chantagista

– Capítulo III

Por Jorge Moreira Leonardo

Sol Português

Uma noite em que bebia um copo com alguns dos poucos amigos que lhe restavam, um deles disse-lhe que aquela casa tinha um passado histórico. E quando lhe perguntou o porquê da ironia, o amigo contou-lhe que naquela casa aconteceram autênticas orgias, quer hetero, quer homossexuais.

Levou o assunto à conta de uma graçola do amigo e nunca mais pensou nisso.

Um dia, ao desmantelar um armário, viu uma caixa com o aspecto aristocrático das que embalam chocolates de qualidade, embora um pouco enferrujada. Quando se preparava para a lançar no lixo, sentiu que ela continha algo.

Quando abriu a caixa concluiu que se o amigo pecou foi por defeito e não por excesso. Estava cheia de fotografias que, ainda que amarelecidas pelo tempo e humidade, davam para ver com razoável nitidez as cenas mais escabrosas que a mente humana possa imaginar e até os participantes. Olhou à volta, receando que outro trabalhador tivesse assistido à cena, e envolveu-a na sua samarra para levar para o apartamento.

Após o jantar, fechou-se no quarto e examinou as fotografias uma a uma. Cada fotografia deixava-o mais surpreso do que a anterior, principalmente pelos participantes. Alguns já falecidos, mas outros ainda vivos e tidos como pessoas de grande respeitabilidade, até tendo desempenhado papéis de grande relevo na sociedade.

De imediato pensou que tinha ali um meio de ganhar algum e que se aquela caixa lhe veio parar às mãos, foi porque o destino assim quis. Cedo aprendeu a moldar a própria consciência, para o que arranjava os mais convenientes argumentos. Ademais, o Mal encontra sempre quem o concretize.

José de Freitas estacionou o carro em frente a sua casa e já ante-gozava o prazer de tomar um duche, um pequeno almoço e uma soneca até à hora do almoço. Como segurança de uma discoteca, calhara-lhe naquela semana o turno da sexta-feira, das 10 da noite às quatro da manhã de sábado, o pior de todos, intervindo sempre que o álcool e a droga começassem a dominar o ambiente e surgissem alguns desacatos.

Puro engano! Ao fechar a porta do carro viu um corpo humano estendido no chão, seis ou sete metros à sua frente. Ainda pensou:

– "Parecia-me que já tinha a minha dose bem servida de bebedeiras. Só me faltava esta!"

Mas ao chegar junto do corpo depressa percebeu que estava na presença de um cadáver. O sangue e um tremendo golpe na garganta não permitiam qualquer dúvida.

Telefonou para a PSP dando conta do facto e o agente que recebeu a notícia disse que ia informar a Polícia Judiciária, e aconselhou-o a aguardar no local.

Desolado, abriu a porta de casa, chamou pela esposa, que lhe apareceu de roupão e estremunhada, narrou-lhe a ocorrência e disse-lhe que tinha de esperar pelas autoridades. A esposa informou-o que tinha sentido um carro parar ali perto e depois arrancar com grande velocidade.

Fechou a porta de casa e refugiou-se no carro, pois a noite estava bastante fria.

(Continua na próxima edição)


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