PENA & LÁPIS


Correspondente de Portugal:

Ser importante

Por Humberto Pinho da Silva

Sol Português

Ao folhear "A Conquista da Felicidade", de Bertrand Russel, deparei com trecho que considero curioso e digno de ser bem pensado.

"Embora o dinheiro por si mesmo não seja suficiente para tornar as pessoas importantes, é difícil ser-se importante sem dinheiro. Além disso mede-se a inteligência pelo dinheiro que se ganha. Um homem que ganha um dinheirão é um homem inteligente; um homem que não ganha tanto, não é."

A propósito vou contar-vos interessante episódio ocorrido com senhora, mãe de amigo meu já falecido.

Certa ocasião, a mãe professora do secundário precisava de consultar um cardiologista, mas não conhecia nenhum de confiança.

Dialogando com colegas sobre o assunto, recomendaram-lhe um, afirmando ser muito competente.

A senhora ficou radiante, mas logo indagou:

"Qual é a marca do carro do médico?"

Disseram-lhe que era viatura utilitária, já antiga.

Respondeu tristemente a senhora, desiludida:

"Não deve ser grande cardiologista para ter um carro tão antigo!..."

Este caso verídico foi-me contado pelo filho da senhora doutora.

Como ela, quantas vezes não se avalia a inteligência, a capacidade e a cultura de alguém pelo dinheiro que possui ou os bens que tem?!

Senhora brasileira, residente em São Paulo, ao saber que minha filha era catequista e semanalmente dava aulas na paróquia aos pequerruchos, perguntou-me:

"Quanto ganha? É que tenho uma moça que podia também ganhar alguma coisa."

Desiludi-a ao afirmar que ela nada usufruía. Acrescentei, para estupefacção sua, que ainda gastava muito com prendinhas para os miúdos.

Há, também, quem pense que os articulistas e os escritores que colaboram na grande imprensa a não ser os consagrados recebem pelo trabalho.

Desenganem-se quem assim julga. Alguns, para verem o nome em letra de forma, têm até de mendigar...

Mas se soubessem disso, os leitores diriam: "E nós que pensávamos que era inteligente e ganhava muito com os escritos!…"

Gente há que tudo mede pela quantidade de dinheiro que se recebe, porque avaliar doutro modo requer inteligência e reconhecer que comunicar, muitas vezes, é uma necessidade imperiosa e não mero lucro.


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